São enfermeiros, médicos e técnicos de diagnóstico. Ao tiro de partida, responderam com a reacção de quem está habituado a não perder tempo. Missão? Cuidar dos outros e salvar vidas.

Tiago Maia gostou de sentir na sua cidade cheiros que apenas descodificava na floresta. Ter tempo e disponibilidade para reconhecer estas coisas, entre turnos de mais de 12 horas num hospital, não é para todos. A verdade é que sentir é o primeiro passo para saber cuidar. Tiago é enfermeiro há oito anos no Centro de Reabilitação do Norte - Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia e Espinho. No triatlo, tem-se destacado nas provas de cross.
É um todo-o-terreno que foi obrigado a sair de casa durante a pandemia.“Por precaução, fui viver com a minha namorada para outro local de forma a contactar menos com a minha família, já que ela sendo também enfermeira, esteve em contacto direto com doentes infectados com covid-19 desde cedo”, explica o atleta do Sporting Clube de Espinho. O vírus alterou rotinas, sentires e perceções. Tiago não tem dúvidas de que as “inegáveis carências do nosso SNS” só foram superadas “graças a uma mobilização fantástica de pessoas, pequenas e grandes empresas que de várias formas trabalharam para facilitar a vida às instituições de saúde”, produzindo equipamentos de proteção individual. É esse sentido colectivo que quer guardar destes tempos difíceis. Isso e o sorriso de quem voltou para casa com a certeza de que foi cuidado como todos nós merecemos. “Gosto sempre que os meus pacientes me procurem e reconheçam por ter feito algo diferente por eles. Neste estado de confusão e de tantas máscaras à mistura, gostei especialmente que isso tivesse acontecido”, desabafa.
“Gosto sempre que os meus pacientes me procurem e reconheçam por ter feito algo diferente por eles”, Tiago Maia
Só quem não conhece o Tiago é que pode duvidar que assim tenha sido. Enquanto o triatleta do norte se mantinha focado na sua missão, mais a sul, no Hospital da Garcia da Orta, um colega confessava as fragilidades dos novos tempos. Filipe Dias, enfermeiro há dez anos, explica que os primeiros tempos não foram fáceis: “Não me sentia bem com o que fazia, tinha receio e sentia-me desapoiado, pois cada um estava numa luta interior como eu estava. Felizmente, essa fase passou e neste momento consigo estar mais calmo por saber como me posso defender e defender os outros”. Para além do stress e do medo, os hospitais passaram a ser também espaços de vazio. Filipe guarda essa imagem para vida.
“O que mais me impressionou foi a solidão de todos os doentes internados no hospital", Filipe Dias
“O que mais me impressionou foi a solidão de todos os doentes internados no hospital, na medida em que não existiam qualquer tipo de visitas. Os doentes sentiam-se desamparados e extremamente deprimidos por não poderem estar perto de quem mais queriam”. A esta sensação junta-se a ausência de contacto. Até os olhares já não são o que eram. Quem o diz é Joana Hipólito, enfermeira no Hospital de Loulé. “O mais difícil é cuidar das pessoas e elas não conseguirem ver as nossas caras. Não conseguimos esboçar aquele sorriso que por vezes acalma a dor ou o desconforto. Agora não existe o toque pele com pele que usamos para afagar a mão, ou o rosto, em jeito de conforto. Já temos tido utentes que nos dizem que nos vêm visitar quando tudo isto passar porque querem conhecer as nossas caras”, explica a triatleta do Vela de Tavira.
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